Influenciadoras que presentearam crianças negras com banana e macaco de pelúcia são condenadas a 12 anos de prisão por injúria racial
O Globo - Nancy Gonçalves Cunha Ferreira e Kerollen Vitoria Cunha Ferreira terão que cumprir pena de 12 anos em regime fechado.
As influenciadoras digitais Kerollen Vitoria Cunha Ferreira e a filha, Nancy Gonçalves Cunha Ferreira, foram condenadas, nesta segunda-feira, a 12 anos de prisão em regime fechado por injúria racial. Os crimes foram cometidos contra duas crianças negras, de 9 e 10 anos, que receberam das mulheres uma banana e um macaco de pelúcia. As cenas foram postadas nas redes sociais das criadoras de conteúdo. Responsável pela sentença, a juíza Simone de Faria Feraz, da 1ª Vara Criminal da Comarca de São Gonçalo, município da Região Metropolitana do Rio, afirmou que os atos cometidos por Nancy e Kerollen correspondem a uma "monstruosidade".
Segundo a magistrada, as influenciadoras não postaram “inocente brincadeirinha”. "Não, as rés criaram conteúdo, ridicularizaram as crianças. Pouco importa se no momento em que (...) recebe uma banana e (...) um macaco de pelúcia não tivessem, naquele momento, repito, a perfeita consciência da chibata em seus pequenos corpos. Não, o crime se protrai no tempo e ganha contornos de verdadeira monstruosidade quando publicam, sem dó e respeito, suas reações imaturas e inocentes em rede social. Destaco que o momento em que se dá a consumação é justamente após as postagens, com a extrema divulgação, nesse momento é que após cientes das ofensas as crianças são vitimadas".
Em depoimento, Nancy e Kerollen alegaram que ajudavam as famílias das duas crianças e afirmaram que seguiram uma "trend" de redes sociais. As duas negaram serem racistas e disseram não saber o que é racismo recreativo.
Na sentença, a juíza destacou que "nada mais absurdo querer fazer crer que nesses dias de conhecimento imediato, fácil acesso, as rés não soubessem o que é racismo. Não viviam as rés em tribo isolada, sem rede social, longe de tudo e de todos, absortas em si. Não e não! Faziam seu ganha pão, nada módico, é bom de ver, justamente em publicações em rede mundial de computadores".
Simone de Faria Feraz afirmou também que "o que fizeram as rés, em íntimo de vontades, foi sangrar, mais uma vez, em açoites os nascidos de África. (...) Ao fazer jocoso o anseio de crianças entregando-lhes banana ou macaquinho de pelúcia, animalizando-as para além do humano, riram de suas opções cegas, em verdade sem escolha. Pior, ao afirmarem que nada fizeram, que ao outro cabia a culpa da disseminação do ódio, lavaram as mãos, brancas, como senhores de engenho antes de cada taça de vinho. E, é nessa esteira de ódio e dor que não há cabida para minorar os efeitos de tamanho racismo".
Os vídeos
Kerollen e Nancy divulgavam conteúdos no Instagram, no TikTok e no Youtube e reuniam mais de 13 milhões de seguidores. Nas imagens divulgadas com as crianças, Kerollen conversava com um menino negro em uma calçada e questionava se ele gostaria de receber um presente ou R$ 10. Ele opta pelo presente, mas, ao perceber que se tratava de uma banana, responde “só isso?”. Disse que não gostou e deixou o vídeo da influenciadora. Segundo as investigações da Polícia Civil, o mesmo menino já havia sido abordado em outra oportunidade pela criadora de conteúdo.
Já em outro registro, Kerollen aparecia abordando uma menina na rua e fez uma proposta similar, oferecendo a opção de a criança escolher entre R$ 5 ou uma caixa. A criança opta pelo “presente”, o recebe das mãos da influenciadora e abre, vendo se tratar de um macaco de pelúcia. Aparentando ter ficado feliz, a garota abraça o brinquedo e agradece a influenciadora.
O que é racismo recreativo
O termo racismo recreativo foi criado pelo pesquisador Adilson Moreira, em livro de mesmo nome. Nele, Moreira explica que a expressão veio como uma forma de combate a práticas que muitas vezes são consideradas brincadeiras inofensivas, mas que na verdade são uma forma de agressão a pessoas negras. Fabiano Machado da Rosa, advogado especialista em compliance antidiscriminatório, explica que o racismo recreativo é velado pelo "humor".
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